20 de junho de 2011

Desgosto

Dos meus defeitos, e não são poucos, talvez o pior seja não esquecer o que me magoou, independentemente de quando ocorreu o fato feito em meu desagrado. Sei que isso é prejudicial não só a mim, mas também às pessoas com quem eu me relaciono, mas não consigo deixar de pensar no que aconteceu, foi dito, ou não. Parece-me que a mágoa é recente, apesar de ter sido há muito tempo. A dor é a mesma, a raiva é igual e o desapontamento é tão grande quanto no dia exato em que me senti agredido, ferido e humilhado.

Mesmo que me peçam desculpas por me magoarem, não consigo perdoar totalmente. As desculpas não fazem a ferida no peito parar de doer. Amenizam o estrago causado, porém não apagam o mal que me foi feito. Se são necessárias então? Obviamente sim. É o mínimo que o errante pode fazer para diminuir um sentimento de desgosto provocado por um descuido impensado. Não sei perdoar os erros dos outros, apesar de querê-lo. Minhas cicatrizes são expostas e sensíveis, voltam a doer a qualquer instante, com a mínima lembrança. Fecho o cenho no mesmo instante, franzo a testa com a mesma intensidade e, não raro, trato com desdém como se fosse hoje o mal feito ano passado, retrasado, dez anos atrás. Guardo mágoas como utensílios não usados cotidianamente em baús da memória, prontos para serem revelados caso precise. E não é por querer ferir quem me feriu em uma vingança infantil que faço questão de recordar a quem me causou tristeza para a proporção do meu ressentimento, embora tenha um pouco disso, não é o principal, nem o que admiro. Faço para que não se esqueça da falta; para que não se repita da mesma forma; para que se lembre de que pequenos gestos infelizes, os detalhes apenas, maltratam o coração. Mas lá no fundo, sinto-me satisfeito por fazer com que esse mesmo erro doa, como um tapa violento, no rosto de quem mo deu. Não sou de tudo uma pessoa vingativa, mas sou humano, não um mísero inseto sem a dádiva do sentimento.

Cazuza — novamente ele — conseguiu expressar um lado positivo nisso num verso genial de Muito obrigado (por ter se mandado), quando diz “pelos dias de cão, muito obrigado (...) me trair, me dar inspiração preu ganhar dinheiro”. Óbvio que a dor que se sente é lacerante, mas tenho que usar de artifícios para transformá-la em algo, no meu caso, arte. E quando ganho o meu suado dinheiro com ela, preciso agradecer pela iluminação artística. Mas queria antes de tudo não tê-la. Tenho-a e por isso hoje escrevo. O que me levou a pensar estas pobres palavras hoje foi um fato passado que já deveria ter sido enterrado e devorado pelos vermes, contudo, como já expliquei, é difícil demais para eu deixar as cortinas caírem para encerrar o drama da minha vida.

As pessoas, embora não reconheçam, vivem hipocrisias. Lembro-me de Gregório de Matos em seu “pequei Senhor, mas não porque hei pecado”, como se pecar fosse motivo para Deus ser feliz na glória da absolvição. Não sou Deus, nem passo perto de sua bondade, portanto não me venham com essa história de me contentar com um pedido de desculpas quando se sabe que seus atos egoístas provocam sentimentos ruins naqueles que os querem bem, a fim de abrandar a ira de sofrer o desengano.

Alberto da Cruz

19 de junho de 2011

Cuidado com o que dizer


Ser professor é dar um duro danado e quase nunca ter retribuição às noites acordado corrigindo provas, planejando aulas e estudando. Mas, às vezes, acontecem situações inusitadas, muitas vezes hilárias.

A aula era de Literatura. Entrei na sala e comecei a reclamar sobre o camarada que se apaixona e escreve poemas de amor.

— Poetas de ocasião versando sobre clichês românticos mais batidos do que vitamina na lanchonete da esquina. Com o coração se faz literatura ruim.

Alguns riem eufóricos, outros arregalam os olhos, alguns poucos se encolhem nas cadeiras com o olhar vazio.

— Pior, não contente ainda, o infeliz apaixonado traz os poemas encadernados, mostrar a sua péssima obra poética, sonhando ser o próximo Camões. Leio aqueles versos insossos, mal escritos, nada originais e, por incentivo apenas, teço um moderado elogio, sem deixar de lado o conselho para que leia bastante e escreva mais como exercício literário. Penso ter me livrado de tal moléstia, mas na semana seguinte, lá vem novamente o pseudo-poeta com mais versos inúteis. — forço uma expressão de desdém e continuo — Sim, estão muito bons — respondo com educação — mas continue lendo mais.

Faço uma pausa. Olhar perdido como se estivesse a ponto de me jogar pela janela.

— Não havendo nenhuma melhoria nos versos, nem mesmo um arremedo de originalidade, na terceira vez que recebo os poemas, olho de cara feia e ponho as poesias sobre a mesa sem interesse. O poeta fica triste, percebe que há algo errado, mas volta ao seu lugar, pensando que deve ser alguma coisa relacionada ao meu humor. Na semana seguinte não comento os textos, eles são tão ruins, melosos, ingênuos de mais para perder o precioso tempo em sua leitura. Não — brado para a turma. — Chega de lixo! Poesia não se faz com o coração. É com bons sentimentos que se escreve o lixo literário. A inspiração não faz o poeta, é preciso muito mais do que um sentimento comum como o amor para se fazer poesia. Portanto, parem de me mostrar péssimos textos inspirados por paixão. Na pensem que são poetas por estarem apaixonados. A poesia é muito mais do que uma dor de cotovelo. Parem! Vocês não são poetas! — digo exaltado, insuflando as veias.

A turma se entreolha. Não entendem o ódio do discurso.

Prossigo:

— Esta porcaria literária existiu no Romantismo, mas acabou, para nossa felicidade. Quem insiste nisso é um trouxa movido por sentimentalidades. Não é assim que se faz poesia. Para fazer versos é preciso o domínio da técnica textual, conhecer a língua com esmero, não fazer rimas comuns, buscar as palavras raras. Escrever é um trabalho árduo, cansativo. Não essa lamúria infeliz da alma apaixonada. Não se escreve com alma, se escreve com a inteligência.
Alguns alunos me fuzilavam com os olhos. Outros riam muito da minha exaltação.

— A literatura é arte, como tal deve ser feita com esse intuito. Valorizar a forma, cultuando sua perfeição exata — terminei o meu discurso e fui ao quadro, pondo-me de costas para a turma.
Enquanto escrevia “Parnasianismo” abaixo da data, ouvi um burburinho no fim da sala. Virei novamente para os alunos, dizendo, já sorrindo como de costume:

— Esse era o pensamento dos poetas parnasianos a respeito das artes poéticas, negando a produção romântica no século XIX.

Uma aluna deixava escorrer umas poucas, mas sentidas lágrimas.

— Professor — disse com a voz engasgada — o senhor pode devolver os meus poemas que deixei na sua mesa semana passada... — e rompeu num choro sentido.

Dizer depois que era somente uma brincadeira para exemplificar o discurso parnasiano não me livrou a cara. Ela até hoje me olha com raiva.

Alberto da Cruz

16 de junho de 2011

Ponto de Segurança... fail

Meu ponto de segurança e margem para desespero acabou ontem. Mas calma, amigos, não é nada grave — para os outros. Costumo mesmo fazer drama em tudo, afinal resquícios românticos ainda existem em mim. Leia-se bem: resquícios. Há muito não sou o poetaço romântico sentimentalóide de outros tempos, quando ainda pensava que as lágrimas vertidas no papel decoravam a página com minhas dores lacerantes e belas. Na verdade só manchavam a porcaria da folha e muitas vezes estragavam o trabalho poético. “Exagerado, eu sou mesmo um exagerado”, gritava Cazuza, grito eu.

Ontem à noite fiz a postagem de Eternos Amantes e me assustei ao correr os olhos no documento principal: as páginas escritas acabaram! Não tenho mais nada para postar semana que vem, não tenho nada pronto para postar semana que vem, nem mês que vem... Protelei meses para escrever o romance, acreditando que o que já estava pronto daria conta do recado até que eu desse cabo da história. Agora o cabo desceu com violência e minha cabeça e a história acabou comigo.

Volto a escrever, não por prazer, mas por obrigação, já que não tenho mais para onde correr. De certo, eu precisava mesmo queimar umas gordorinhas e acabar com esse sedentarismo que vem me cansando. Já estava na hora de começar o trabalho e de transformar o hiato em ditongo. Esta semana preciso entrar no clima de Eternos Amantes, preciso ouvir músicas que me remetam ao clima nostálgico de Cláudia, ao choro incontido e à dor de cotovelo de Luciana e, não menos importante, ao arrependimento de Jorge.

É sempre difícil regressar a um texto parado no tempo. Não é nada fácil voltar a uma vida esquecida e retomá-la de onde paramos, porque ninguém é o mesmo, todos mudamos, inclusive as personagens de um romance.

Alberto da Cruz

12 de junho de 2011

Dia dos Namorados


Hoje é o dia em que o namoro vale a pena. Hoje pra quem beija a mesma pessoa sempre tem presente. O dia dos namorados é mais uma data comercial do nosso calendário capitalista, afinal só se namora no dia 12 de junho, não é? Bem, para o comércio essa ideia é bem aceitável, desde que as vendas superem os dias normais, já que todo mundo namora, todo mundo gasta.

Veja bem, acordo cedo e peço uma farta cesta de café da manhã para o meu amor, R$100,00; uma mensagem no telefone não sai por menos de R$5,00; aquele buquê de flores para fazê-la suspirar arranca do bolso cerca de R$80,00; e ainda estamos de manhã. Vem o almoço, e a fatia mínima é de R$100,00; se o vinho for nacional. Depois de saciar o estômago, um passeio pela orla ou parque da cidade e mais uns trocados se vão com guloseimas e afins. A noite chega e com ela as maquininhas de débito. O jantar promete, e não é qualquer feijão com arroz, não. Jantar de dia dos namorados deve ser em um bom restaurante, afinal devemos impressionar, fingir pelo menos uma vez por ano que podemos esbanjar tanto. Ah, a grande entrada, um belo prato principal, um bom cabernet sauvignon e aquela sobremesa de fazer a boca salivar... fazem a conta bancária esvaziar quando a senha é digitada na máquina do cartão. E lá se vão mais uns R$200,00. Que tal um cineminha? Mais R$40,00 fácil. Um barzinho a meia-luz, com voz e violão? No mínimo R$50,00. E claro, finalizar a noite numa bela suíte de motel. Suíte, porque quarto vagabundo é para os dias comuns, hoje é dia dos namorados e, para valer mesmo a pena, tem que ter banheira com hidromassagem, piscina térmica e sauna, no mínimo. Quanto? Bem, já que essa é realmente a parte que interessa, R$350,00 pelo pernoite, está bem pago. E ainda tem o presente, que pode variar de R$100,00 a R$1000,00... ufa!!!

No dia seguinte, ela tem certeza de que tudo foi válido e o dia dos namorados foi perfeito, o olhar apaixonado, o sorriso no rosto, a certeza de que a escolha foi certa e o amor durará a vida inteira. Por outro lado, você, amigo, agradece fervorosamente a todas as divindades conhecidas e desconhecidas por ser apenas um o dia dos namorados, porque, caso contrário, poderia se chamar o dia dos endividados.

Bem, um feliz dia dos endivida... quer dizer, namorados para todos.


Alberto da Cruz

6 de junho de 2011

Sal, cal e alho

Foi apenas uma brincadeira, um trote para formatura, mas a homenagem foi belíssima. A nerdice contagiou o 3º ano do COSAF e arrancou gargalhadas em todas as salas. Hoje não me senti sozinho, hoje um bando de nerds esteve comigo, iguais temporários, semelhantes por instantes...


Aproveito o momento e parabenizo a turma pelas excelentes notas na avaliação de Literatura. Depois de Gregório, o Barroco ficou fácil... "Sal, cal e alho"

Alberto da Cruz

4 de junho de 2011

Reencontro

Depois de passar por maus bocados na Feira LIterária Raul Pompeia, tive o prazer de reencontrar Evanildo Bechara. Fazia 7 anos desde que nos encontramos pela última vez, num curso de Letras qualquer.
Hoje, a promessa, segundo o próprio benemérito, continua uma promessa, apesar de mais velha e madura do que antes.

Alberto da Cruz