8 de junho de 2012

O respeito é de poucos

A passarela existe, não é apenas um item decorativo sobre nossas rodovias. Sempre que atravesso a Rodovia Rio-Santos, perto da Escola Cleusa Jordão, desço da minha bicicleta e a empurro pela enorme passarela. Sabe-se que o ciclista deve desmontar e caminhar por calçadas, faixas e passarelas como um pedestre comum, mas não é isso que vemos no nosso dia-a-dia. Sinto um misto de graça e raiva quando me perguntam o porquê de ter a mania de empurrar a bicicleta em vez de rapidamente passar por esses lugares pedalando. A resposta, em geral, vem seca: “eu tenho educação”.

Uma passarela serve para que os acidentes sejam evitados, dando às pessoas segurança para atravessar uma via. Mas parece que a segurança não é importante para pessoas que se aventuram ao cruzar a Rio-Santos. Em frente à Cleusa Jordão, num dos bairros mais populosos de Angra dos Reis, passa a rodovia. Primeiro, construíram a passarela ignorada por muitos. Em seguida, instalaram quebra-molas para diminuir a velocidade dos veículos automotores. Agora colocaram muros a fim de impedir a travessia de pedestres e retorno de automotores. De que adiantam essas medidas, se as pessoas insistem em esperar um pouco e correr como loucos para alcançarem o lado oposto? E a cena se repete todos os dias para o nosso espanto.

É preferível parecer trouxa a passar por esperto, praticando ações erradas; é preferível ser cuidadoso a machucar um passante; é preferível manter a integridade física a cair no chão. O mal da nossa sociedade é querer sempre se sentir superior a tudo e a todos. Temos um desejo absurdo de querer levar vantagem em tudo, não respeitando o direito dos outros. Nada, além das nossas vantagens, é levado em conta.
   
Geralmente ouço de companheiros de pedal que ninguém respeita o ciclista, e não é mentira. Mas o “ciclista” respeita alguém? A falta de civilidade em nosso trânsito é gritante, uma horda desenfreada em guerra contra o mundo por um espaço de asfalto. O trânsito brasileiro é uma guerra, carros contra bicicletas, bicicletas contra pedestres, pedestres contra carros e a educação contra todos. A solução seria construir calçadas, faixas, ciclovias e passarelas... mas esperem, elas já existem! Infelizmente, em cidades pequenas, como Angra, elas são mais decorativas do que funcionais. As placas estão lá: “pedestre, atravesse na faixa”, “use a passarela”, “ciclista, só utilize a calçada desmontado”, mas a maioria se finge de cego ou não se importa com as consequências. Depois, culpar alguém por nossos erros é fácil, assumir nossa responsabilidade, jamais.

Alberto da Cruz

2 de junho de 2012

Conviver e melhorar

Ontem de manhã, vi um atropelamento. Assim, de repente, a normalidade se transfigurou em confusão. Cena mais do que comum: um carro, uma bicicleta, uma colisão, ossos quebrados, automóvel danificado, curiosos, comentaristas, várias testemunhas dúbias, poucos testemunhos verdadeiros, por fim a ambulância e polícia. Prato cheio para destilar meu veneno pelas instituições, pela sociedade, pelos escrúpulos, pelo trânsito, pelos danos, pelo homem, pela vítima, pelo agressor, mas vou me ater a poucos, prometo (de dedos cruzados).

Não faz muito tempo que Thor Batista, filho do empresário Eike Batista e da modelo Luma de Oliveira, envolveu-se em um brutal acidente de carro, matando um homem simples que atravessava a via de bicicleta. As imagens divulgadas do acidente mostraram a violência do ato e o poder de destruição. A história é mais do que conhecida, portanto não preciso detalhar aqui os pormenores do acidente. O fato é que, como o jovem Thor é filho de um dos homens mais ricos do mundo, a crítica popular logo o transformou em vilão antes mesmo de se apurar o fato. Não estou aqui defendendo o dublê de semi-deus nórdico, mas para atentar a um fato bem corriqueiro, nem sempre o motorista é culpado pelo atropelamento, principalmente os envolvendo “ciclistas”; assim mesmo, entre aspas, pois andar de bicicleta não faz do homem um ciclista. Este é o ponto em que quero chegar.

É comum vermos em nossas estradas e ruas centenas de pessoas andando de bicicleta, dividindo o pequeno e mal estruturado trânsito com carros, motos e... pedestres que pensam que a rua é extensão da calçada. A bicicleta é um meio de transporte, portanto deveria haver ao menos um pequeno curso para que fossem utilizadas Infelizmente estamos longe de isso acontecer. Qualquer um que compre uma bicicleta se acha no direito de seguir o fluxo sem ter a mínima noção das leis que regulamentam e regem o trânsito. Com isso vemos absurdos como o tráfego na contra-mão e a desculpa impensada de que assim podem ver os carros que vão em sua direção, uma ilusão; já que para o motorista de um veículo automotor, tal ato o põe em uma situação de extremo risco.

Quantos “ciclistas” simplesmente aparecem na via, surgindo misteriosamente de uma rua paralela, vindo carro ou não? Quantas vezes já não vimos freadas bruscas por que um “ciclistas” misteriosamente apareceu na frente de um carro? Quantas vezes já vimos um ciclista mudar  de direção sem sinalizar o movimento, pondo em risco a sua vida e o patrimônio alheio? Quantas vezes já nos deparamos com uma bicicleta vindo em nossa direção e precisamos agir rapidamente para não lançá-la ao ar? Inúmeras é a resposta, pois são fatos corriqueiros de quem enfrenta o trânsito diariamente.

O automóvel é uma arma em mãos imprudentes, mas a imprudência também está no lado mais fraco da ação, tendo tanta ou mais culpa nos acidentes, já que são dispensados das obrigações legais...

Ontem um rapaz guiava sua bicicleta pela contramão e trazia uma menina na garupa, numa das vias mais complicadas de se andar no centro da Japuíba. Não bastasse sua imprudência, ainda punha em risco a vida de outrem. O resultado é mais do que sabido. Num cruzamento, chocou-se com um carro. A menina pulou a tempo, mas o rapaz foi lançado ao chão. Em segundos, vários populares se aglomeraram para assistir ao ocorrido e condenar o seu acusado. Julgamento covarde, pois todos viram que o motorista tinha razão, mas pelo simples fato de ter atropelado o “ciclista”, não o dispensaram da culpa por não ter visto o imprudente. Mais uma vez a torpe idéia de que andar na contramão é mais seguro. Já está mais do que provado que o deslocamento deve ser feito seguindo o fluxo.

Para piorar a série bizarra dos fatos, enquanto se esperava o socorro, a aglomeração de curiosos aumentava, o trânsito na via principal seguia, mais bicicletas circulavam por onde não deveriam. Por pouco, muito pouco mesmo, mais um “ciclista” escapou de se envolver num acidente, entrando na frente de um caminhão que passava lentamente pelo local. E a culpa ainda é do motorista?

Quantos casos semelhantes acontecem diariamente sem que apareçam na televisão e ganhem as capas dos jornais por se tratarem de pessoas comuns. Fosse guiado por uma caríssima Mercedes, fosse um estúpido fidalgo, fosse um milionário qualquer, o fato teria as proporções colossais que vimos há poucos dias.

Faz alguns meses, testava meu carro que acabara de sair da oficina. Numa volta rápida, mas em velocidade reduzida, envolvi-me num acidente com um “ciclista”. O rapaz se colocou ao meu lado em sua bicicleta e, sem sinalizar, fez uma conversão inesperada. Caiu, machucou a perna e arranhou meu carro. Imediatamente parei para socorrê-lo. Ele, impensadamente, veio tomar satisfações, reclamando que empenei a sua velha bicicleta. Depois de uma rápida explicação sobre normas de trânsito e mostrar-lhe o prejuízo que me deu, percebeu que estava errado. Antes que eu pudesse completar a ligação para as autoridades competentes, ele já havia montado em sua bicicleta e desaparecido entre os curiosos. Fiquei com o prejuízo, mas agradecido por não ter machucado o imprudente.

Há também o outro lado da medalha. Motoristas que não respeitam os ciclistas, estes sim, sem aspas. Pessoas que respeitam as leis de trânsito e sabem o que é certo ou errado. Segundo o código, o ciclista deve se deslocar na pista de rolamento, na mão de direção, próximo ao bordo, deixando a via livre. É comum, por gentileza, o motorista dar toques curtos na buzina a fim de alertar sua presença; contudo, talvez por raiva, talvez por prepotência, alguns fazem questão de aproximar demais o veículo, fechando a passagem e jogando o ciclista para fora da pista. Qual a intenção verdadeira? Por que não podemos conviver trânsito sem essas preocupações? Por que falta a todos a educação? Precisamos, urgentemente, aprender a conviver com os outros para melhorarmos.



Alberto da Cruz
motorista e ciclista