19 de dezembro de 2011

Filhas

"Os braços de uma mãe são feitos de ternura e os filhos dormem profundamente neles."
Victor Hugo

É tarde. Hora de dormir. Mas uma mãe nunca dorme de verdade. Pensar nos filhos às vezes nos dá uma aflição danada. São tantas preocupações que nos consomem na hora de pôr a cabeça no travesseiro, que muitas vezes atravessamos a madrugada sem pregar os olhos. Será que elas estão bem? Sentem alguma coisa? Pesadelos?

Ontem mesmo minha barriga estava enorme. Eu, tão magrinha e delicada, com aquela barriga imensa. Sentia os chutes gostosos dentro de mim, da minha vida se mexendo dentro de mim. Ainda ontem Teresa nasceu cheia de vida, roubando todas as atenções e amor que havia. Minha pequena Teresa, tão branquinha e meiga. Perfeita. Um pedaço de alegria gerada por mim, tão imperfeita. Reinava absoluta com seus risinhos tímidos, com seu olhar piedoso. Ainda ontem minha barriga estava enorme de novo. Desta vez à espera por Juliana. Tão delicada quanto à irmã, com seus olhos vivos e sorriso constante. Minhas duas meninas no mundo, dois pedaços meus separados do corpo.

Eu queria protegê-las do mundo perigoso, por isso as cobri com minhas asas. Por serem tão curtas, aproximei-as de mim, agarrando-lhes sem deixar que se afastassem um centímetro que fosse para longe dos meus olhos atentos. Se eu pudesse, não as deixava nem por um único segundo, mas a vida não nos deixa fazer tudo o que queremos. Eu precisava de um tempo distante dos meus bens mais preciosos. E eu ia ao trabalho, mas ficava em casa no pensamento. No que as minhas queridas faziam na minha forçada ausência.

Era duro sentir a saudade consumir minhas forças. Mas ao chegar do trabalho meu coração se acalmava, quando os quatro bracinhos me apertavam com força. Carregava-as no colo, rodopiava-as pela casa numa alegria contagiante. Eu e minhas filhas, três corpos separados, mas unidos no amor.


Alberto da Cruz

30 de novembro de 2011

Minhas Palavras

Minhas palavras são prostitutas que se vendem por pouco, muito pouco. Fazendo a graça de alguns, essas ingratas disfarçam escassa emoção. Às vezes, chorosas, comovem alguns ingênuos, mas irritam a maio-ria com seu jeito estúpido de ser. São tão falsas e vazias, embora cumpram seu papel doentio, o de entreter por um curto período para serem esquecidas logo depois. Sem valor! Minhas palavras são putas fétidas e sem brilho; não se produzem, não se arrumam, não se maquiam. Elas vão ao mundo como querem, sem cuidados no trato ou no efeito. Envergonham-me todos os dias.

Infelizmente, como cafetão, recebo por elas o valor do prazer que proporcionam. Mas por mal dispô-las à venda, o valor pago não é suficiente para nada, nem mesmo para um café e um cigarro barato, na padaria da esquina. Minhas palavras não me dão prazer, são frias como um cadáver de mulher com as pernas abertas sobre a cama, totalmente passivas, esperando, indiferentes, o término do ato. E depois, vestem-se para partir, exigindo seu pagamento parco.
Quando se vão, deitado em minha cama, só consigo pensar em que estado decadente lhes fiz o horrendo parto. Como filhas sem pai, gerei-as por orgulho e vaidade. Quis oferecer-lhes o melhor de mim, po-rém o meu melhor foi o pior que pude produzir. Agora tenho que aturá-las no mundo, dar-lhes o mínimo de afeto ou partirão de minha vida, deixando-me entregue a um sentir desesperado, no isolamento completo do abandono.

Por mais vadias que sejam, e são, fazem companhia nas noites solitárias que perco sem dormir. Mes-mo sabendo que para mim o preço é maior, farto-me com elas num incesto monstruoso, consumindo suas virtudes, tentando transformá-las no que me convêm, embora, no fim, seja eu o modificado, o rejeitado pela produção precária da lida mal realizada.

Devorando minhas putas palavras, tenho a ilusão de ser alguém por um instante. Sonho com melho-res dias e um reconhecimento tardio. Chego a acreditar que posso assumir o bordel, ampliá-lo, elitizá-lo, me-lhorar o seu produto, oferecer mais variedades, fazer brilharem os olhos dos clientes, orná-lo com belas peças de consumo. Mas acordo e percebo que manter utopias não me traz a felicidade. Sou incapaz de algo bom. A mediocridade é a minha sina.

Minhas palavras são vergonhas saindo da boca como blasfêmias, contudo ainda insisto em dizê-las; insisto em desperdiçar tempo com imundices e dejetos do meu ego ferido. Insisto porque preciso delas, mas elas não precisam de mim.
Minhas palavras são putas. E eu estou falido.

Alberto da Cruz

4 de novembro de 2011

Na rota do desenvolvimento

O Brasil está, finalmente, se tornando um país de primeiro mundo. Basta que olhemos para as notícias recentes nos jornais para constatarmos que o que acontece naqueles países tão invejados também anda ocorrendo por aqui. Infelizmente o que nos aproxima dos países desenvolvidos não são os aspectos positivos que levam nossos conterrâneos a enfrentar as dificuldades de um novo idioma, os costumes diferentes dos nossos, o clima muitas vezes imensamente frio, não. O Brasil anda copiando na escala do desenvolvimento os aspectos negativos e as graves crises que agem inversamente ao caminho dos emigrantes desesperançosos de nossa terra de ordem e progresso.
Brasileiros, voltem!

Nós temos terremotos perceptíveis agora. É verdade, recentemente houve um abalo sísmico no Atlântico, produzindo, pequeno ainda, mas no futuro a promessa é que seja maior, um tremor de cinco segundos em quatro estados, dois da região Sul e dois da Sudeste. Bem, Paraná e Santa Catarina são um caso a parte, pois são mais europeus do que brasileiros em muitos aspectos, a começar pela grande quantidade dos imigrantes e suas culturas diversas ali arraigadas; mas nas regiões do Rio de Janeiro e de São Paulo surpreendidas pelo pequeno abalo, houve até comemoração com champanhe e fogos de artifício para comemorar a nova. Rumo ao primeiro mundo, dizia um entusiasta feliz, uma pena que durou muito pouco e não deu para gravar com a minha ultramoderna filmadora digital. Fica p’ra próxima vez!

Pois bem, antes dos terremotos, já desembarcaram em nossos portos as mais modernas bugigangas vindas do Japão, Estados Unidos da América, Alemanha e outros países produtores que, como nós, também querem subir na tabela do campeonato, como a China, por exemplo. Temos em nossas casas um arsenal eletrônico tão vasto e tão sem importância em nossas vidas, que freqüentemente me pergunto por que diabos gastei uma fortuna para a montagem do meu incrível home teather, com os melhores aparelhos antes importados, agora fabricados, em maior parte, na famosa Zona Franca de Manaus. Mas não tenho certeza de que a produção é original ou se me chegou via Paraguai.

Nossa televisão agora é digital como nos países que invejamos. Melhor recepção para não fazermos nada quando estamos alienados no sofá diante de programas de entretenimento. A leitura é secundária como andam fazendo por lá, apesar de o governo investir em projetos de incentivo, nós continuamos trocando os livros por um bom programa de alienação, quer dizer, televisão.

Para os automaníacos, a certeza de que rumamos ao primeiro escalão é o investimento na indústria do setor. Temos além do fusca, esse parece que nunca sairá de nossas estradas, o Pólo, que segundo a Wolksvagen é igual em todo o mundo. Ainda não chegamos a perfeição, porque o que gastamos com impostos é ainda um assalto à mão armada feito pelo governo. Mas se todo imposto é meio abusivo, não deve ser culpa do governo.

Ainda não somos uma Holanda, mas as drogas que circulam por aqui tem um sistema de venda muito bem organizado, embora seja um negócio ainda à margem dos legalizados, mas se tem até mesmo um plano de carreira lógico que desde a infância prepara o indivíduo para chegar ao topo da profissão, certamente em pouco tempo nos equipararemos ao referido país das drogas e do sexo livre. Pois é, a grande diferença entre o Brasil e a Holanda na forma de se vender o sexo é que lá o cliente escolhe a sua mercadoria em vitrines, mulheres expostas como objetos em lojas, já aqui temos as estradas como expositores, principalmente nas proximidades às paradas de caminhoneiros, mas há também os classificados de jornal e casas especializadas para escolhermos melhor o nosso produto. E convenhamos, a mulher brasileira é muito mais interessante do que a européia.

Como nos Estados Unidos, nós também temos casos de pedofilia. Tudo bem que aqui, em geral, são casos isolados, não é como lá, em que os padres possuem um caderninho com o nome dos coroinhas e suas habilidades, digamos, pecaminosas. Nossos padres ainda estão atrasados na onda do desenvolvimento, mas se insistirmos muito, quem sabe, um dia, eles serão também manchete de jornais sensacionalistas, num escândalo típico de paróquia americana.

Casos como o assassinato da menina Isabella são comuns por outras terras. Nossos jornais já se assemelham a CNN ou BBC com sua cobertura jornalística de ponta para encobrir, além de crimes parecidos como esse, outras barbaridades cometidas por homens psicóticos, e repórteres preparados para vender uma única notícia, que embora chocante pela monstruosidade dos acusados, escondem outros problemas que deveriam também ter seu espaço ampliado nos meios de comunicação, como as CPI’s que nunca dão em nada ou os gastos inacreditáveis dos nossos governantes.

Infelizmente o Brasil ainda deve em alguns aspectos para chegar ao patamar dos países desenvolvidos. Nossas eleições não têm erros na apuração dos votos, nossos governantes são pacíficos e não promovem guerras, nosso povo é caloroso e recebe a todos de braços abertos, nossa alegria é constante e contagia como uma doença, nossas reservas naturais são lindas que o mundo inteiro as admira, nosso país é miscigenado, multi-étnicos e vivemos como iguais, nossa fé em melhores dias é inquestionável, apesar de todos os problemas que enfrentamos. Somente quando resolvermos esses problemas cruciais em nossa sociedade, nós conseguiremos nos equiparar com os grandes monstros do desenvolvimento mundial, mas até lá continuaremos, felizmente, um país de terceiro mundo, não em desenvolvimento.

Alberto da Cruz
2008

5 de outubro de 2011

Salas de espera, e muita espera

Triste a constatação de o porquê de médicos e dentistas terem belíssimas e confortáveis salas de espera para atenderem seus pacientes. Geralmente são lugares de baixa iluminação, muito suave e tranqüilizante, paredes com cores relaxantes escolhidas num estudo sobre o efeito dos tons nas pessoas. Não é, e isso é fato, por apenas fim estético na decoração ambiente. Na verdade os tons são utilizados para manterem seus pacientes quietos nas poltronas por longas horas sem se manifestarem, sem questionarem, sem desistirem da consulta, enquanto são obrigados a esperar pelo terrível descompromisso com os horários marcados na agenda.

Quem nunca amargou a espera por um médico que se atrasou, não uma, não duas, mas em todas as vezes em que chegamos àquele lugar cujos horários são feitos por um relógio que parece sempre estar quebrado? Difícil acreditar que ninguém jamais se irritou lendo as revistas muitas vezes tão velhas que a manchete de capa mais se parece um título de um periódico de História do que um fato contemporâneo. E haja revistas para manter as pessoas quietas, e muito entediadas, sentadas sem expressão nenhuma que não seja a do tédio. Pior ainda é o gênero das publicações dispostas em todos os cantos, que ainda não consegui entender, são as mais fúteis encontradas nas bancas, e ainda maior é o desespero quando se percebe que não foram compradas a esmo, mas sim assinaturas anuais de textos e fotos vazios de conteúdo. Nada contra pessoas que se interessem por fofocas de celebridades ou pelo que acontecerá nos próximos capítulos das telenovelas de rede aberta, mas, convenhamos, não se pode ignorar que alguns pacientes gostem de leituras sérias ou de atualidades. Há certo desprezo sobre a capacidade intelectual dos enfermos por parte dos médicos? Afinal, é difícil crer que alguém que dedique tantos anos de sua vida desenvolvendo suas inteligências e se especializando em uma profissão tão importante subestime aqueles que seguiram um campo de atuação diferente, mas tão importante quanto, para a formação de uma sociedade.

Mais se parece a um daqueles filmes de terror classe B, os famosos filmes trash, do que, por exemplo, padecer na sala de espera de um dentista por horas, rodeado de desconhecidos e ouvindo por detrás da porta do consultório o barulho irritante de motorzinho. É angustiante. Por falar nisso, a tecnologia está tão avançada que me pergunto: é mesmo necessário que esse aparelho tenha o mesmo barulho insuportável desde os primórdios da odontologia? O motivo deve ser, muito provável, algo masoquista; uma forma de assustar os pacientes que já sofrem pelas dores de uma cárie ou um nervo arruinado. Imagino o sorriso satisfeito do dentista sob aquela máscara branca, enquanto o paciente arregala os olhos e treme inteiro quando ouve aquele zumbido diabólico do instrumento de tortura. É um problema com a mãe, diria Freud, em seu divã numa consulta psicanalítica. E será que Freud também mantinha revistas de fofocas em sua sala de espera para que os seus pacientes passassem o tempo?

Alberto da Cruz

22 de setembro de 2011

O Nosso Último Capítulo

Ela e eu... Chegamos ao fim do último capítulo de nós dois e fechamos nosso livro com tristeza.

Este texto é difícil de sair. As palavras brigam comigo, não querem ser escritas. Mas têm de ser. Por mais sofrimento que me cause escrever agora, que a dor é gritante, preciso descarregar as frustrações do fim prematuro do sonho. Não consigo nem mesmo dar coerência ao que quero dizer, talvez nem mesmo queira dizer nada, somente exteriorizar a minha dor de agora.

O amor é cruel quando mal amado; é um assassino quando desrespeitado. Eu e ela não somos hoje mais nada, embora havia pouco tempo éramos tudo. Tudo, hoje não sobra a sombra do sonho. Eu aqui estou, com lágrimas seguras nos olhos e o coração dilacerado pela mágoa devastadora, esperando que o sono me leve a angústia para longe, ao menos me dê uma pausa, um momento para recompor as partes espalhadas no chão. Caído como um bêbado, que antes dava passos ébrios no ar, sou tomado por alucinações do rosto dela. E quero amá-la, mas no último instante lembro do descaso que me entregara quando só queria o deleite dos seus braços magros. Eu quero amá-la, mas é de ressentimento que meu coração se recorda quando os seus olhos faiscantes me vêm à mente.

O livro acabou sem final feliz, porque os relacionamentos de verdade não são ficção, não há idealismos nem utopias, só a realidade, e ela não é bonita para aqueles que amam sem ter o ser amado. Um abismo sem fim que nos puxa para baixo. Eu me sinto caindo, despencando como uma pedra lançada no ar. No fim, sou o vidro partido, estilhaçado, cheio de marcas que a vida impiedosa nos tinge.

Estou a um passo de me despedir da vida. Estou a um passo de pôr fim ao meu tormento. Hoje vou me deitar entorpecido, cheio de comprimidos e uma garrafinha de black label. Espero que o sono não termine, que o dia não me amanheça, que o sol não mais brilhe. Hoje dou adeus e parto à procura de Deus. Mas tenho certeza de que quem me acolherá não será a Providência, será vermelho como nas crenças. Se outra vida existir depois desta, espero que seja um lugar melhor do que este inferno de viver. Se há mesmo outra realidade, outros mundos além deste, que seja melhor, que eu tenha morada entre aqueles que, como eu, desistiram de inventar meios de fingir do que tortura a vida cheia de sonhos improváveis. Eu queria mesmo é que não houvesse nada depois de expirar, eu queria que a luz fosse a sombra negra e nada mais importasse além da surdez, da cegueira, da morte.

Meu estômago dói e minha cabeça pende para baixo como se quisesse cair do meu corpo. Eu e ela éramos um, agora ela e eu não somos nem o zero, nem o saldo negativo que nos sobra quando um segue o outro caminho.

Voltemos o livro para a estante, voltemos a vida num instante e pausemos o filme triste da nossa despedida, do meu adeus.


Alberto da Cruz

18 de setembro de 2011

Parada na Chuva

"Ela nunca falou comigo, nunca me deu um sorriso, nem mesmo me notava, nem mesmo me ignorava... eu era invisível aos seus olhos, o nada. Mas um dia, chovia. Ela sorriu, acenou-me sorridente como se eu, de repente, como num mágico instante, existisse. Acelerei o carro, tornando-a invisível, parada na chuva, encharcada e desiludida."

Alberto da Cruz

4 de setembro de 2011

Meu doce surrealismo

O que um morcego, uma pessoa inesperada, uma cerveja gelada roubada por um policial numa escola, um beijo apaixonado e imagens do passado tem em comum? Nada, mas em um sonho, tudo é possível!

Acordei num pulo, ainda com o gosto do beijo na boca — e que beijo. Uma cena comum, eu sei, mas o que importa no emaranhado de fios que formam o desejo onírico é a sensação que temos na hora intensa em que os limites do subconsciente nos abraçam na realidade. Ainda sentindo o gosto do beijo e calor do corpo beijado no meu, atrevo-me a registrar o que me fez despertar com esperanças de que minha vida não pode ser tão ruim como eu penso que é — ou faço ser.

Com os lábios próximos, ela me disse num tom apaixonado: Eu amo você. Uma frase tantas vezes ouvida ganha, a cada vez que é dita, uma magia ímpar, ainda mais na voz de quem jamais se espera ouvi-la. Ainda lembro de ser carregado por ela, que me rodopiava pelo salão — não, não era o contrário — cheio de rostos comuns, companheiros do cotidiano, que me olhavam sem nada entender, paravam para ver a cena mágica de uma explosão aflita de amor. A alegria, o ardor, a paixão consumindo o mundo num único instante. Meus dedos em seus cabelos, a maciez dos seus fios... o sonho.

Mas como entender o que não tem explicação? Por que o seio nu de uma pessoa que não se quer aparece e não brigamos? Por que não nos fartamos, apenas conversamos amigavelmente e, com o senso moral, ajeitamos a situação? Que homem nega belos alvos seios quando está só? Que homem nega uma mulher quando sente a libido o consumir, mas não nega a boca daquela que lhe rouba a paixão?

Eu perguntava em meu sonho tresloucado: Por que nunca antes te beijei, minha querida? E nunca encontrarei respostas, porque sonho é sonho, e vivemos atrelados, presos à realidade.

Pior de tudo... acordei. Mesmo impressionado, acordei. E não é possível retomar o que ficou no travesseiro. Não foi um filme interrompido por um irritante comercial. É engraçado como tentamos regressar às imagens da memória falsa, mas não conseguimos. Forçamos a mente, desejosos de estarmos no mesmo lugar, continuando o que nos foi maldosamente proibido pelo abrir dos olhos, mas nada mais acontece.

Eu agora queria voltar para aquela boca, queria estar no calor daquele abraço, queria conter o corpo daquela que buscava conforto em mim. Volta, querida, enxuga as suas lágrimas no meu ombro, entregue-se à paixão do meu desassossego!

E o morcego? Seria a minha consciência me atacando? Eu dormia, abri os olhos e o vi me espreitar, voar sobre minha cabeça num impulso ligeiro. Com as mãos eu o agarrei, segurei-o com firmeza entre os dedos, mas não o quis matar. Abri a janela e o soltei noite adentro, para que voasse em paz. Porém, por que a minha consciência, se for este o sentido do morcego, veio me visitar antes das loucuras que sucederam sua visita melancólica? Por que minutos antes do seio exposto, o policial me levou a garrafinha cheia de heineken, deixando-me o café fumegante? E as imagens do passado que me assombram? Será que era o meu momento de escolha?

Tantas perguntas me devastam, e eu só consigo pensar no gosto do beijo dado por uma pessoa inesperada...

Alberto da Cruz

9 de agosto de 2011

Procura-se um leitor

Lia o último livro de Rubem Fonseca, uma coletânea de crônicas chamada O Romance Morreu, quando parei para pensar no assunto do texto inicial. Hoje é tão difícil ver jovens dedicando o seu tempo à leitura, afinal são tantas as comodidades da televisão, do rádio, da falta do que fazer, que ler um livro é absolutamente descartável. O jovem não gosta de ler, seja porque não entende metade do que está escrito a sua frente, seja por preguiça de mergulhar no mundo mágico da leitura.

Não há mais tempo para magia. O mundo é rápido, de informações precisas. Ler requer tempo e dedicação, coisa rara neste universo de mensagens instantâneas pelo computador. O livro se perde, se esquece, morre aos poucos como um indigente qualquer.

É espantoso que em meio a tantos velórios simbólicos cresça o número de escritores diariamente. Mas o que não entendo é, justamente nesse ponto conflitante está a questão, que se não há mais leitores, como pode haver tantas pessoas escrevendo suas histórias? Escrevem para quê? Para quem?

Novos escritores têm dificuldades imensas para conseguir o seu espaço no mercado editorial, esse imenso monstro que nos assusta tanto como o bicho-papão de nossa infância. É mesmo complicado despertar interesse por parte das grandes editoras para lançar o seu nome nos catálogos, mas não é impossível, pois se realmente fosse, elas estariam falidas em pouco tempo, porque sem renovação do quadro de autores seria incrível manterem-se. Ainda existem as pequenas editoras, que juntas garantem uma boa fatia do mercado. Mas se além das grandes, as pequenas também conseguem, embora com menos barulho, o seu espaço, há algo errado quando dizemos que não temos mais leitores.

Seria perfeito se ainda hoje o fluxo fosse o mesmo daquele existente nos séculos XVIII e XIX, quando a principal forma de entretenimento eram os livros, os grandiosos romances de José de Alencar a Machado de Assis espalhados pela cidade em folhetins, volumes editados, não na estante, mas nas mãos de felizes e sonhadoras pessoas. Aí sim poderíamos dizer que não nos faltam leitores. Mas acontece que o tempo passou, o mundo mudou tão rapidamente que muita coisa perdeu espaço para outras. A televisão, por exemplo, é um dos maiores inimigos da leitura, não porque a substitui, mas porque as informações veiculadas são rápidas, correspondendo às expectativas das pessoas que não possuem tempo para dividir entre trabalho, família e lazer. O livro é um prazer individual, não se pode dar-se a ele coletivamente. Não se pode reunir a família para uma leitura densa e delirante, como deve ser. A leitura abre a mente numa viagem solitária para lugares incríveis. Cada um tem sua própria forma de ver a realidade representada em cada parágrafo, em cada frase, tornando impossível a viagem em companhia. Já a televisão não, ela reúne, diverte, emociona ao mesmo tempo a família inteira, embora a união também seja solitária, porque ninguém conversa fora do tempo dos comerciais.

Há poucos anos surgiu a conversa de que os livros não seriam mais impressos, porque com as preocupações ambientais e o avanço tecnológico o papel seria substituído por dados, os e-books, ou livros eletrônicos, surgiram para acabar com o livro físico. Resolução para os problemas da vida moderna, o desmatamento e a falta de espaço. Centenas de livros guardados num único CD devia ser o pensamento do inventor dessa insanidade. Quem ama os livros sabe a diferença entre o texto virtual e o físico. Não há como comparar o prazer de se folhear um livro, de sentir sua textura e provar o seu aroma. A idéia do extermínio não parece ter ido longe, mas foi de grande valia o crescimento da internet e dos e-books, pois muitos daqueles rejeitados pelas companhias livreiras puderam aparecer ao público com seus próprios e valorosos esforços.

Uma rápida pesquisa em sites de busca nos revela a existência de milhares de novos escritores. E juntamente com eles, um número ainda maior de leitores. As pessoas, portanto, lêem hoje, infelizmente não como nos tempos em que o livro era o único meio de se perder nas tramas fictícias. Dividimos o bolo, mas ainda temos nossa parte, e ela não é tão pequena como se imagina. Se quisermos aumentá-la, é preciso que deixemos a soberba de lado e nos preocupemos em conquistar mais e mais adeptos, agentes ou passivos, dessa atividade magnífica que é a literatura, para que não precisemos pendurar placas com os dizeres de “procura-se um leitor” pelas ruas.

Alberto da Cruz

29 de julho de 2011

Zico marca mais um golaço

Romário avança pelo meio e toca rápido para Zico marcar o gol. Um momento. Zico, o Galinho de Quintino, marcar o gol? Poderia ser mais um dos golaços de Zico nos meus sonhos, mas não foi. O lance ocorreu no Jogo das Estrelas de 2009, em pleno Maracanã, palco de memoráveis jogos dos deuses do futebol carioca, nacional e internacional.

Hoje é um dia de felicidade. Hoje pude rever o maior ídolo da torcida rubro-negra em campo, defendendo as cores do Flamengo, ao lado de outros imortais que já vestiram o manto sagrado.

Arthur Antunes Coimbra acertou de novo ao convidar os homens que fizeram a alegria de milhões na década de 80 e alguns dos que nos fizeram sorrir, e continuamos a sorrir, neste ano.

Sempre falei para o meu irmão que Zico era divino, que o maestro Júnior jogava por música, que Adílio era fera, que Djalminha não fazia feio, que Gilmar fechava o gol, que Romário era o terror. E meu irmão, que só tem dez anos, dizia que o Adriano é o Imperador e que o Petkovic é craque. Não discuto com ele, não adianta. Mas hoje pude mostrar ao pequeno rubro-negro que o pouco que vi em minha infância era a mais pura verdade. Não adiantava assistir aos jogos em DVD, ele dizia que o futebol era diferente. Mas hoje não. Hoje ele viu o Zico jogar num Maracanã lotado, viu Zico fazer três gols lindíssimos, viu o Imperador perder não sei quantos gols feitos, viu Ibson e Juan mostrarem que craque o Flamengo faz em casa, viu Wilson Gottardo parar Edmundo, Charles Guerreiro roubar a bola de Vagner Love, Cláudio Adão cadenciando o meio de campo, Jorginho cruzando com precisão, Júnior driblando pelo meio, pelas pontas, Alcindo já sem nenhum cabelo, Andrade fora da área técnica, Tita desarmando o adversários, Zinho armando pela esquerda, Nunes entrando pela ponta, Renato Gaúcho sendo vaiado por mais de 75 mil pessoas e Romário dando belíssimos passes de letra com a camisa do Mais Querido. E também reviu Fábio Luciano, o capitão do Pentatri, Ibson e sua garra, Juan e seus desarmes precisos... Que lindo!

Obrigado, Zico, por mais este golaço em sua brilhante história vitoriosa. Obrigado por mostrar que todos podem fazer de um jogo beneficente mais do que uma forma de arrecadar fundos, sobretudo, obrigado por mostrar aos nossos meninos o quão bom é ser Flamengo.

Ah, já ia esquecendo, o jogo terminou em 5X5, mas isso é o menos importante.


Alberto da Cruz

26 de julho de 2011

Simples gostos na vida

Eu gosto de acordar cedo e ver o mar pela janela do quarto. Eu gosto de beber café forte e muito quente, enquanto fumo um cigarro, logo que me levanto da cama, antes de fazer qualquer coisa.

Eu gosto de fazer sexo pela manhã, embora, à tarde, seja bom e, à noite, também. Gosto de experimentar, variar, inovar. Quase dispenso todos os tabus, mas só quase, pois há alguns impraticáveis. Não tenho lugar preferido, pode ser na cama, no sofá, no chão, sobre a mesa, debaixo da mesa, no banho, na cozinha, do lado de fora, dentro do carro. O que importa é a hora do prazer, e mais nada. Mas devo confessar que às vezes prefiro o depois ao durante, aquele momento gostoso em que os corpos extasiados se abraçam e, sentindo o calor do outro, adormecemos felizes num gesto enamorado. Sexo, para mim, é entrega total. Não curto um lance casual, tem de haver envolvimento afetivo sério, fazer com amor mesmo, pois sem, nada tem graça.

Gosto de música e das emoções que ela me propicia. Não tenho um estilo definido, ouço de tudo. Para mim, o que importa é o momento, por isso podem me pegar cantando de um samba-canção de Cartola a um grito visceral de Rock. Tudo depende do instante, mas tenho meus preferidos. Chico Buarque me faz pensar, amar e produzir, meu ídolo e exemplo tanto no cenário musical quanto no campo literário. A poesia de Humberto Gessinger me fascina como os poetas contemporâneos que admiro. Alcione me faz chorar, principalmente quando estou em crises amorosas. Ouvir Cazuza cantar me dá um tremendo tesão, daqueles de deixar maluco mesmo; mas também me faz pensar na transitoriedade da vida e como o tempo é voraz. Se minha vida tivesse uma trilha sonora, ela seria de vários estilos, passeando dos clássicos compositores à musicalidade contemporânea.

Gosto de livros, minha paixão antiga. Cada volume adquirido é um orgasmo múltiplo. Vivo entre eles e de tanto estimá-los, tornei-me um bom leitor, mas poderia ser melhor. Nada me encanta mais do que uma boa leitura, seja de um romance, biografia ou poesia. A arte literária me toma os sentidos e me leva ao êxtase do supremo num gesto sublimado. Por vezes troquei diversos programas para me deleitar com um livro e, juro, jamais me arrependi de me prostrar no sofá e viajar pela madrugada. Se ler é um orgasmo, escrever é a minha doce sina. Escrevo para me livrar tédio, para espantar a solidão, para sair da rotina, para desabafar minhas mágoas, ilusões e desespero. Ganho, bem menos do que gostaria, falando de minhas tristezas e de minhas insanidades, embora já faça um bom tempo que não vejo lucros sobre minhas divagações. Não paro com a escrita, mesmo descompromissada, é ela que me acalenta um pouco o espírito revolto.

Gosto de filmes, e passo horas diante da televisão, entretido com alguma trama fictícia. Não sou um cinéfilo assumido, mas tenho minhas películas prediletas. Meu gosto é variado. Adoro comédias do tipo besteirol. Amo filmes de terror, principalmente sobre vampiros, lobisomens e assombrações. Choro assistindo a um bom drama. Quero amar da forma como vi em algum romance. Sou louco por filmes de máfia e do período da Recessão Americana. Hoje em dia tenho prazer com as produções nacionais, diferentes das pornochanchadas antigas. Assisto a, mais ou menos, cinco filmes por semana, fora aqueles que eventualmente passam nos quatorze canais específicos que assino.

Gosto de carros. Sem restrições, qualquer tipo me atrai. Tenho predileção pelos antigos nacionais que a maioria dos antigomobilistas adoram como: Maverick, Opala, Puma, Miúra e Galaxie Landau. Sou louco por esportivos importados, tive inclusive um Honda Civic que era o meu xodó, mas fui obrigado a vendê-lo. Gosto de me sentar ao volante e ouvir o barulho do motor ao virar a chave e levantar os giros. Dirigir é mais do que uma simples necessidade, é uma válvula de escape. Quando estou na estrada, faço questão de abaixar os vidros e deixar o vento bater em meu rosto. Gosto de ver a estrada pelo pára-brisa e saber que estou no controle. Amo velocidade, e às vezes exagero no acelerador, mas também curto uma volta bem devagar, observando o mundo passar a minha volta.

Gosto de plantas, de cultivá-las, de orná-las em pequenos vasos cheios de pedrinhas e musgos diversos. Quando estou com as mãos sujas de terra, delicadamente ajeitando as raízes, parece-me que esqueço as minhas próprias mazelas numa atividade catártica. Tenho meus delicados bonsai, a única forma de se ter árvores em uma casa sem espaço, e outras de diversos tipos. Perco horas debruçado sobre as pequenas plantas, podo, reparo, aramo, crio estilos, admiro, chego ao êxtase. Ainda encherei a casa de verde, mas tudo tem seu tempo certo.

Gosto de cozinhar, embora não possa comer quase nada do que levo ao fogo. Tenho prazer, pelo menos, em ver os amigos se fartando com os pratos que preparo, e chego a experimentar alguns deles apenas por vaidade, embora meu médico me repreenda por furar a dieta controlada de ingestão de açúcar, mal dos diabéticos. Aprendi a gostar de saladas e alimentos coloridos naturalmente, mas ainda enlouqueço com uma apetitosa massa.

Gosto de trabalhar, ainda que não receba o valor a que a classe educadora mereça. Realizo-me em sala de aula, quando me sinto responsável por, além de passar o conteúdo exigido pelas grades curriculares de ensino, ajudar a moldar um cidadão consciente. Meus alunos são meus amigos e os prezo da mesma forma que os íntimos. Reclamo bastante, mas por nada largo meu ofício. Acredito na educação, mas não no sistema educacional atual. Espero uma reviravolta nos moldes em vigor, antes que as coisas saiam do controle.

Gosto da companhia dos amigos, por isso abro as portas de minha casa para todos eles e os deixo tão à vontade como se estivessem em suas próprias. Compartilho do meu pão, da minha água, do meu uísque, do nacional é claro, o importado apenas a um seleto grupo dentro do círculo fraterno. Bons papos, conversas amenas, um programa íntimo em conjunto, tudo isso me satisfaz. Não preciso de agitação todas as noites para me satisfazer, na maioria das vezes sentar no sofá e assistir a um bom documentário, ou mesmo um filme bobo, bebendo e beliscando um aperitivo qualquer é muito mais prazeroso do que uma noite entre desconhecidos conhecidos.

Gosto ainda mais de ficar sozinho, embora precise de alguém muitas vezes. Faz parte de minha estranha figura trancafiar-me no escritório e refletir a vida. Já experimentei o convívio em sociedade de diferentes formas, mas preferi a solidão como amiga íntima. Sigo meus próprios horários e não mudo minha rotina. Lavo a louça quando quero, arrumo a casa quando melhor me convém. Dito minhas próprias regras e não dou satisfação a nenhuma pessoa por minhas escolhas. Sou independente, pago minhas contas, batalho pelo meu sustento, não preciso, pois me sujeitar aos caprichos de ninguém.

Gosto de adormecer nos braços da mulher amada, e ainda mais de acordar ao seu lado, mesmo que seja raríssimo, salvo em poucas oportunidades. Gosto de amá-la nesse ineditismo que esta relação me representa. Descobri que a felicidade existe graças ao brilho dos seus olhos, mesmo que eu bata no peito para defender meu direito de ser triste, uma vez que a tristeza é parte de mim. Momentos diáfanos ocorrem quando juntos o mundo pára, embora o tempo corra célere, sem respeitar as vontades do nosso pobre coração.

Gosto de pequenas coisas na vida. Eu valorizo detalhes que para a maioria são insignificantes. Tenho minhas loucuras e às vezes sou meio radical com minhas atitudes. Não sou perfeito como nenhum homem é, não sou especial, nem anormal; eu sou apenas um pouco diferente neste mundo de pessoas tão iguais.

Mas o que eu gosto mesmo é de fazer sexo pela manhã.




Alberto da Cruz

14 de julho de 2011

Todo amor se acaba com um motor batido

Sou um amante de carros. Completamente apaixonado por essas belezinhas automobilísticas. Passo horas admirando modelos, lendo revistas especializadas e sonhando com máquinas belas e potentes. A paixão é tão grande que gera ciúmes diversos, por isso tenho medo de que a mulher amada me peça, um dia, para escolher entre ela e os carros. Ficaria em uma sinuca impossível de sair, na saia justa mesmo. E pior ainda seria dar uma resposta. Imaginem a cena:

“— Não dá mais para disputar sua atenção, querido. Ou esse maldito carro ou eu!
Silêncio.
— Querido, ou o carro ou eu?
Mais silêncio.
— Porra! Será que você pode parar de encerar essa merda pela milésima vez e falar comigo?
— Depois de polir ele vai ficar lindo, não é?”

O carro para o homem não é somente um meio de transporte, é a extensão de o seu próprio ser. Um pedaço projetado pela engenharia que, em muitas vezes, diz quem ele é. Na busca por “status”, o desejo por um modelo de marca famosa e série limitada é comum a todos, desde o jovem ao homem feito. Desfilar pelas ruas da cidade com seu novo automóvel faz bem ao ego masculino, tão bem quanto o quarentão que exibe sua namoradinha de 18 anos. Se juntar os dois então, teremos a vida perfeita.

Talvez por isso, cuidamos tão bem de nossos amados carros. Facilmente dizemos uma série de nãos, inventamos diversas desculpas, até mesmo doenças que nos põem de cama por tempo indeterminado, para não varrer a casa, lavar o banheiro, arrumar a cama, o que seja; mas para pegar a mangueira e ficar horas sob um sol escaldante molhando o carrinho, não há mal que nos impeça.

" — Querido, você não estava passando mal? — pergunta a esposa.
— Estava não, meu bem — responde o marido, levando a mão ao estômago e fazendo cara de dor — estou ainda.
— Então o que é que você está fazendo aí?
— Nada não.
— Como nada não?
— Sabe como é, eu estava lá na cama, sentindo dor. Vim pegar um pouco de sol, senti calor e resolvi molhar a cabeça. E já que a mangueira estava na minha mão, eu não iria deixar o carro ficar com vontade, né?
— Hã!? E a louça que pedi para você lavar?
— Ai que dor! Acho que, assim que terminar aqui, vou me deitar um pouquinho.
— Puta que o pariu — resmunga ela, batendo a porta da cozinha."

Posso facilmente comparar o carro a uma mulher, com a diferença de que, por incrível que pareça, gastamos mais e muito mais felizes com nossos carros. Se falta dinheiro para renovar o guarda-roupa, comprar melhores iguarias culinárias, arrumar as necessidades da casa, vamos empurrando como dá, privando-nos de várias coisas para, assim que a situação desapertar, dar um jeito. Mas se o carro apresenta um mínimo sinal de problema, corremos ao mecânico e assinamos o cheque sem pensar duas vezes, mesmo que o valor do conserto ultrapasse o nosso ordenado. Afinal cheque especial existe para isso, não é mesmo?

Não há maior prazer do que, num sábado de sol, passar o dia inteiro lavando a lataria com água e sabão especial. Encerar delicadamente cada parte como se fosse o corpo de uma magnífica mulher. Retirar o pó do interior com cuidado redobrado para não riscar o painel. Aplicar silicone nas partes plásticas para revitalizar o que foi gasto. Horas de deleite, impagáveis momentos em que o dono e o carro comungam como um casal perfeito, sem brigas, discussões ou insultos, somente o amor de um com o outro como bons amantes que são.

Dirigir é uma terapia que custa só o preço da gasolina. Eu, quando tenho um problema, não penso duas vezes, corro à garagem e pego a estrada. Abro os vidros e deixo o vento entrar. Ouço o som dos pneus no asfalto e me esqueço da vida e dos males que carrego em minha cabeça. Quando regresso, não tenho mais nada para me perturbar, um pouco fica em alguma curva, outro no pisar no acelerador, outro na troca de marchas e o último problema, na arrancada forte que faz o coração disparar.

Amo os carros, mas, às vezes, o afeto não é retribuído. Todo amor se acaba com um motor batido.

Alberto da Cruz

11 de julho de 2011

O ontem, hoje

Engraçado como as coisas se pintam na vida. Às vezes se tem tanto a dizer, mas o interlocutor é surdo aos nossos delírios, ou somos mudos quando realmente temos algo de importante a dizer. Passamos por crises diversas na vida, umas importantes demais, outras insignificantes, mas, em geral, são essas que não têm o grande peso que nos põe loucos, ou à beira de um ataque de nervos.

Perdoem-me os amigos, mas estou hoje um tanto sentimental, saudosista, nostálgico. Falta-me o fogo, esfriou o quarto tão de repente, que não tive tempo de buscar o cobertor. Será que o presente está rumando para o passado? Não me entendo quando se trata da emoção. Talvez seja a estrela que morreu, extinguindo seu brilho. Não, realmente não entendo.

Sinto saudade no meu peito, e minha consciência grita como um desesperado em agonia. Tenho saudades, mas não sei se do hoje, ou do ontem longínquo residente nos escombros da memória. Está tão frio aqui. Não me sinto à vontade, não sei mais dizer palavras confortantes, amorosas, românticas. Algo em mim está morto, ou apenas ausente. Tantas dúvidas, tantas indecisões, nenhuma certeza do que havia pouco era o Certo. Mas há certeza em algo, quando a vida é cheia de surpresas e reviravoltas indiferentes à nossa simples vontade?

Sem querer, pus-me de frente ao passado. Escolhas. Desleixos. Inocência. Descuidos. A vida tão surpreendente quando nos guia o caminho por onde nunca imaginávamos passar.

Quem imaginaria, num dia comum, esbarrar com dois passados, ao mesmo tempo, juntos? Dois passados sorridentes, numa caminhada despreocupada pelas ruas do presente. O tempo. Os anos correm, as pessoas envelhecem, perdendo a beleza da juventude. As bocas, os calafrios, os sentimentos, tudo muda; nada permanece igual ao que era antes. Corpos, bocas, nucas. O cheiro, este não muda. As paixões do antes não voltam ao coração. Só mesmo na etimologia, trazemos de volta as imagens perdidas nas falhas da memória. Duas bocas. Duas línguas. Dois corpos. Todos somados a um, formavam um triângulo saudoso de cheiros, cabelos, pelos unidos sobre o mesmo lençol.

Quantos anos se foram no calendário das vagas lembranças? No mínimo dez, onze talvez. Quantas palpitações de corpos se perderam? Quantas carícias? Quantas juras em segredo? Foram amores verdadeiros ou devaneios de paixão? Ah, nada melhor do que o cheiro do passado como o da chuva fina no asfalto!

As três bocas estalaram em toques no rosto, acompanhadas de palavras aos surdos, ditas como mudos, em passos que se separaram depois. As bocas, os corpos se foram. E eu fiquei imóvel em meu instante. Mas agora sinto o gosto que o tempo malogrou. As bocas que foram minhas, e hoje nada são. Os corpos que tive, e hoje não passam de cogitação.

Façamos, então, um brinde ao ontem, como singela lembrança da juventude expirada; como uma sutil recordação do que já não volta, nem vale a pena voltar.

Alberto da Cruz

9 de julho de 2011

Obrigado, Cabral

A forma com que Sérgio Cabral, governador do estado do Rio de Janeiro, trata os professores é vergonhosa. É indecente a proposta de incorporação do Nova Escola aos vencimentos dos servidores. Não bastasse as diferenças de valores na gratificação, o governador ainda propõe a diminuição do plano de carreira, obtido depois de muitas discussões.

Depois de anos sem reajuste salarial, tivemos o desprazer de ouvir propostas risíveis nos últimos anos. Um aumento de doze por cento, dividido em pequenas prestações soou como desrespeito. Quando finalmente tivemos a boa notícia da incorporação do piso máximo aos nossos mirrados vencimentos, poucos acreditaram, e fizeram bem em não acreditar em tamanha lorota.

Sérgio Cabral se comprometeu em nos conceder este aumento em parcelas anuais até o ano de 2015. Um ultraje à categoria que sofre todos os dias com salas lotadas, com a falta de estrutura das escolas e um salário que, em breve, será menor que o mínimo.

Ontem houve votação na Alerj para a lei que diminuiria nosso plano de carreira e nosso aumento salarial parecido com um carnê das Casas Bahia. O que se viu foi o cúmulo do desrespeito ao educador estadual. Policiais lançaram bombas de efeito moral nos professores que acompanhavam a votação, deixando feridos os profissionais que lutam pelos seus direitos ignorados por um governante sem escrúpulos, como todos os outros que prometem e nunca cumprem. Não bastasse a violação dos nossos direitos, ainda agridem o professorado, um dos alicerces da formação e transformação social, moral e fisicamente.

Devemos lembrar ao nosso governador que não somos criminosos, apesar de nos tratarem como seres marginalizados. Não somos arruaceiros, somos professores querendo melhores condições de vida, um salário justo e, principalmente, respeito.

Não me admira o estado do Rio de Janeiro ser tão violento, depois da selvageria de ontem. Uma polícia despreparada, professores miseráveis, governantes hipócritas. A soma desses fatores mostra a cara do Rio de Janeiro: o paraíso para quem é de fora, um inferno para quem está dentro.

Agora vamos esperar até 2015 para receber a nossa esmola. Continuar ensinando, porque somente o amor à educação nos motiva a entrar nas salas de aula, já que o incentivo é a base de presentes desnecessários e investimentos duvidosos.

É melhor ter cuidado com a greve, pois se não tivermos, ficaremos também sem a merenda que, muitas vezes, é o único prato que vemos sobre a mesa.

Obrigado, Cabral, por expor ao Brasil a miséria do educador fluminense.

Rio de Janeiro,
09 de setembro de 2009

4 de julho de 2011

O revés do desgosto

Sempre que discutimos sobre alguma coisa que ocorreu conosco, ouço que só me lembro dos fatos ruins, como se não existissem bons momentos em uma relação. Obviamente, no calor insuportável de nossas brigas, eu só menciono as palavras mal interpretadas ou as ações impulsivas que provocaram algum tipo de sofrimento, na maioria das vezes em mim. Acredito que faça parte dessa hora em que a tensão misturada com a raiva ganha a razão em um jogo desigual. É difícil ponderar quando o sangue está fervilhando. Os erros vêm novamente à tona, não por maldade, mas acabam saindo sem que eu perceba os danos que causo com minhas palavras rudes em meus estúpidos momentos de raiva — e ultimamente eu tenho andado como um cão raivoso, perdendo a paciência facilmente e agredindo qualquer um que me olhe atravessado. O estresse do fim de ano acaba comigo, embora eu tente lutar tenazmente para manter a calma. São provas intermináveis para corrigir, dezenas de diários para fechar, reuniões extraordinárias, conselhos de classe, contas a pagar, textos para entregar, fila de banco, fila de correio, presentes de natal, escolhas, decisões e eu cada vez mais nervoso com o pouco tempo que me sobra no meio de toda essa loucura.

Como as intempestividades ocorrem sem que possamos mudá-las, faz-se necessário domar a fúria negativa que me assola como um leão faminto numa jaula, pois, caso contrário, suas garras podem dilacerar facilmente aquele que provém seu alimento. Não é diferente conosco. Quando brigamos, acabo dizendo o que era melhor calar, a fim de não ferir. O grande problema é que não me calo e, agindo como um violador de túmulos, desenterro mágoas que deveriam há muito ter sido esquecidas. Não lembrar as dores passadas é essencial para a construção do futuro quando não trazem nenhuma lição importante. Não é que não a tenha, mas não se faz preciso dizer do que já foi. Devemos, pois, olhar adiante e buscar novos caminhos para deixar as coisas melhores, sem a sombra do pesar. Não sei ao certo, mas me parece que lentamente estou aprendendo sobre minhas dores na alma, deixando descansar em paz os mortos de minha mente, lutando contra meus fantasmas. Mas não me tem sido fácil enfrentar essa horda nociva sem sair ferido do combate.

Se no momento de mágoa deixo escapar os tormentos, não quer dizer que a nossa vida a dois seja um eterno desgosto, pelo contrário. Passamos juntos os melhores momentos que já vivi. Nada se compara a ternura de um dia com ela. Quando solitário em minhas ilusões ouço o telefone tocar, com o coração a bater desenfreadamente, espero que seja ela do outro lado da linha. É difícil explicar a alegria que me toma quando ouço sua voz gostosa me dizer palavras simples como apenas um “oi”. Quando vejo seu sorriso depois de um dia cansativo de trabalho, meu mundo inteiro parece parar para admirá-la e o cansaço se esvai rapidamente, surgindo em mim uma força que nem sequer imaginava existir. Ao encontrá-la, num abraço saudoso, sentir o calor de sua pele é o contentamento contra as minhas frustrações diárias. Em sua boca morre minha inquietude quando me aprazo com seus beijos carinhosos de ternura. E quando detenho seu corpo delicado sob o meu, bruto, sou uma fênix renascendo das chamas do meu caos para uma vida mais cheia de amores.

Nessas horas de deleite, não há mácula que perdure. Todos os sentimentos de desgosto se vão ao primeiro toque, às vezes nem mesmo isso, pois somente um olhar choroso seu me faz retroceder em minhas decisões impensadas e correr para os braços como uma criança carente aos braços da mãe. E a amo mais, muito mais do que antes, pois só a possibilidade de perdê-la me faz entrar em pânico. Quando a vejo, ainda sinto tremerem minhas pernas e meu coração bater muito mais forte. Se isso é paixão, o fogo voraz que queima rapidamente e logo se apaga, esta dura mais e mais e mais, chegando ao ponto de se fechar um ciclo anual e ainda assim o calor no corpo é o mesmo em proporção crescente do que no início de nosso sério compromisso. Certamente o que temos não é paixão, é mesmo Amor. E não é só desejo, nem um laço físico. O que temos transcende os limites corpóreos e sobe aos céus sublimado.

Alberto da Cruz

20 de junho de 2011

Desgosto

Dos meus defeitos, e não são poucos, talvez o pior seja não esquecer o que me magoou, independentemente de quando ocorreu o fato feito em meu desagrado. Sei que isso é prejudicial não só a mim, mas também às pessoas com quem eu me relaciono, mas não consigo deixar de pensar no que aconteceu, foi dito, ou não. Parece-me que a mágoa é recente, apesar de ter sido há muito tempo. A dor é a mesma, a raiva é igual e o desapontamento é tão grande quanto no dia exato em que me senti agredido, ferido e humilhado.

Mesmo que me peçam desculpas por me magoarem, não consigo perdoar totalmente. As desculpas não fazem a ferida no peito parar de doer. Amenizam o estrago causado, porém não apagam o mal que me foi feito. Se são necessárias então? Obviamente sim. É o mínimo que o errante pode fazer para diminuir um sentimento de desgosto provocado por um descuido impensado. Não sei perdoar os erros dos outros, apesar de querê-lo. Minhas cicatrizes são expostas e sensíveis, voltam a doer a qualquer instante, com a mínima lembrança. Fecho o cenho no mesmo instante, franzo a testa com a mesma intensidade e, não raro, trato com desdém como se fosse hoje o mal feito ano passado, retrasado, dez anos atrás. Guardo mágoas como utensílios não usados cotidianamente em baús da memória, prontos para serem revelados caso precise. E não é por querer ferir quem me feriu em uma vingança infantil que faço questão de recordar a quem me causou tristeza para a proporção do meu ressentimento, embora tenha um pouco disso, não é o principal, nem o que admiro. Faço para que não se esqueça da falta; para que não se repita da mesma forma; para que se lembre de que pequenos gestos infelizes, os detalhes apenas, maltratam o coração. Mas lá no fundo, sinto-me satisfeito por fazer com que esse mesmo erro doa, como um tapa violento, no rosto de quem mo deu. Não sou de tudo uma pessoa vingativa, mas sou humano, não um mísero inseto sem a dádiva do sentimento.

Cazuza — novamente ele — conseguiu expressar um lado positivo nisso num verso genial de Muito obrigado (por ter se mandado), quando diz “pelos dias de cão, muito obrigado (...) me trair, me dar inspiração preu ganhar dinheiro”. Óbvio que a dor que se sente é lacerante, mas tenho que usar de artifícios para transformá-la em algo, no meu caso, arte. E quando ganho o meu suado dinheiro com ela, preciso agradecer pela iluminação artística. Mas queria antes de tudo não tê-la. Tenho-a e por isso hoje escrevo. O que me levou a pensar estas pobres palavras hoje foi um fato passado que já deveria ter sido enterrado e devorado pelos vermes, contudo, como já expliquei, é difícil demais para eu deixar as cortinas caírem para encerrar o drama da minha vida.

As pessoas, embora não reconheçam, vivem hipocrisias. Lembro-me de Gregório de Matos em seu “pequei Senhor, mas não porque hei pecado”, como se pecar fosse motivo para Deus ser feliz na glória da absolvição. Não sou Deus, nem passo perto de sua bondade, portanto não me venham com essa história de me contentar com um pedido de desculpas quando se sabe que seus atos egoístas provocam sentimentos ruins naqueles que os querem bem, a fim de abrandar a ira de sofrer o desengano.

Alberto da Cruz

19 de junho de 2011

Cuidado com o que dizer


Ser professor é dar um duro danado e quase nunca ter retribuição às noites acordado corrigindo provas, planejando aulas e estudando. Mas, às vezes, acontecem situações inusitadas, muitas vezes hilárias.

A aula era de Literatura. Entrei na sala e comecei a reclamar sobre o camarada que se apaixona e escreve poemas de amor.

— Poetas de ocasião versando sobre clichês românticos mais batidos do que vitamina na lanchonete da esquina. Com o coração se faz literatura ruim.

Alguns riem eufóricos, outros arregalam os olhos, alguns poucos se encolhem nas cadeiras com o olhar vazio.

— Pior, não contente ainda, o infeliz apaixonado traz os poemas encadernados, mostrar a sua péssima obra poética, sonhando ser o próximo Camões. Leio aqueles versos insossos, mal escritos, nada originais e, por incentivo apenas, teço um moderado elogio, sem deixar de lado o conselho para que leia bastante e escreva mais como exercício literário. Penso ter me livrado de tal moléstia, mas na semana seguinte, lá vem novamente o pseudo-poeta com mais versos inúteis. — forço uma expressão de desdém e continuo — Sim, estão muito bons — respondo com educação — mas continue lendo mais.

Faço uma pausa. Olhar perdido como se estivesse a ponto de me jogar pela janela.

— Não havendo nenhuma melhoria nos versos, nem mesmo um arremedo de originalidade, na terceira vez que recebo os poemas, olho de cara feia e ponho as poesias sobre a mesa sem interesse. O poeta fica triste, percebe que há algo errado, mas volta ao seu lugar, pensando que deve ser alguma coisa relacionada ao meu humor. Na semana seguinte não comento os textos, eles são tão ruins, melosos, ingênuos de mais para perder o precioso tempo em sua leitura. Não — brado para a turma. — Chega de lixo! Poesia não se faz com o coração. É com bons sentimentos que se escreve o lixo literário. A inspiração não faz o poeta, é preciso muito mais do que um sentimento comum como o amor para se fazer poesia. Portanto, parem de me mostrar péssimos textos inspirados por paixão. Na pensem que são poetas por estarem apaixonados. A poesia é muito mais do que uma dor de cotovelo. Parem! Vocês não são poetas! — digo exaltado, insuflando as veias.

A turma se entreolha. Não entendem o ódio do discurso.

Prossigo:

— Esta porcaria literária existiu no Romantismo, mas acabou, para nossa felicidade. Quem insiste nisso é um trouxa movido por sentimentalidades. Não é assim que se faz poesia. Para fazer versos é preciso o domínio da técnica textual, conhecer a língua com esmero, não fazer rimas comuns, buscar as palavras raras. Escrever é um trabalho árduo, cansativo. Não essa lamúria infeliz da alma apaixonada. Não se escreve com alma, se escreve com a inteligência.
Alguns alunos me fuzilavam com os olhos. Outros riam muito da minha exaltação.

— A literatura é arte, como tal deve ser feita com esse intuito. Valorizar a forma, cultuando sua perfeição exata — terminei o meu discurso e fui ao quadro, pondo-me de costas para a turma.
Enquanto escrevia “Parnasianismo” abaixo da data, ouvi um burburinho no fim da sala. Virei novamente para os alunos, dizendo, já sorrindo como de costume:

— Esse era o pensamento dos poetas parnasianos a respeito das artes poéticas, negando a produção romântica no século XIX.

Uma aluna deixava escorrer umas poucas, mas sentidas lágrimas.

— Professor — disse com a voz engasgada — o senhor pode devolver os meus poemas que deixei na sua mesa semana passada... — e rompeu num choro sentido.

Dizer depois que era somente uma brincadeira para exemplificar o discurso parnasiano não me livrou a cara. Ela até hoje me olha com raiva.

Alberto da Cruz

16 de junho de 2011

Ponto de Segurança... fail

Meu ponto de segurança e margem para desespero acabou ontem. Mas calma, amigos, não é nada grave — para os outros. Costumo mesmo fazer drama em tudo, afinal resquícios românticos ainda existem em mim. Leia-se bem: resquícios. Há muito não sou o poetaço romântico sentimentalóide de outros tempos, quando ainda pensava que as lágrimas vertidas no papel decoravam a página com minhas dores lacerantes e belas. Na verdade só manchavam a porcaria da folha e muitas vezes estragavam o trabalho poético. “Exagerado, eu sou mesmo um exagerado”, gritava Cazuza, grito eu.

Ontem à noite fiz a postagem de Eternos Amantes e me assustei ao correr os olhos no documento principal: as páginas escritas acabaram! Não tenho mais nada para postar semana que vem, não tenho nada pronto para postar semana que vem, nem mês que vem... Protelei meses para escrever o romance, acreditando que o que já estava pronto daria conta do recado até que eu desse cabo da história. Agora o cabo desceu com violência e minha cabeça e a história acabou comigo.

Volto a escrever, não por prazer, mas por obrigação, já que não tenho mais para onde correr. De certo, eu precisava mesmo queimar umas gordorinhas e acabar com esse sedentarismo que vem me cansando. Já estava na hora de começar o trabalho e de transformar o hiato em ditongo. Esta semana preciso entrar no clima de Eternos Amantes, preciso ouvir músicas que me remetam ao clima nostálgico de Cláudia, ao choro incontido e à dor de cotovelo de Luciana e, não menos importante, ao arrependimento de Jorge.

É sempre difícil regressar a um texto parado no tempo. Não é nada fácil voltar a uma vida esquecida e retomá-la de onde paramos, porque ninguém é o mesmo, todos mudamos, inclusive as personagens de um romance.

Alberto da Cruz

12 de junho de 2011

Dia dos Namorados


Hoje é o dia em que o namoro vale a pena. Hoje pra quem beija a mesma pessoa sempre tem presente. O dia dos namorados é mais uma data comercial do nosso calendário capitalista, afinal só se namora no dia 12 de junho, não é? Bem, para o comércio essa ideia é bem aceitável, desde que as vendas superem os dias normais, já que todo mundo namora, todo mundo gasta.

Veja bem, acordo cedo e peço uma farta cesta de café da manhã para o meu amor, R$100,00; uma mensagem no telefone não sai por menos de R$5,00; aquele buquê de flores para fazê-la suspirar arranca do bolso cerca de R$80,00; e ainda estamos de manhã. Vem o almoço, e a fatia mínima é de R$100,00; se o vinho for nacional. Depois de saciar o estômago, um passeio pela orla ou parque da cidade e mais uns trocados se vão com guloseimas e afins. A noite chega e com ela as maquininhas de débito. O jantar promete, e não é qualquer feijão com arroz, não. Jantar de dia dos namorados deve ser em um bom restaurante, afinal devemos impressionar, fingir pelo menos uma vez por ano que podemos esbanjar tanto. Ah, a grande entrada, um belo prato principal, um bom cabernet sauvignon e aquela sobremesa de fazer a boca salivar... fazem a conta bancária esvaziar quando a senha é digitada na máquina do cartão. E lá se vão mais uns R$200,00. Que tal um cineminha? Mais R$40,00 fácil. Um barzinho a meia-luz, com voz e violão? No mínimo R$50,00. E claro, finalizar a noite numa bela suíte de motel. Suíte, porque quarto vagabundo é para os dias comuns, hoje é dia dos namorados e, para valer mesmo a pena, tem que ter banheira com hidromassagem, piscina térmica e sauna, no mínimo. Quanto? Bem, já que essa é realmente a parte que interessa, R$350,00 pelo pernoite, está bem pago. E ainda tem o presente, que pode variar de R$100,00 a R$1000,00... ufa!!!

No dia seguinte, ela tem certeza de que tudo foi válido e o dia dos namorados foi perfeito, o olhar apaixonado, o sorriso no rosto, a certeza de que a escolha foi certa e o amor durará a vida inteira. Por outro lado, você, amigo, agradece fervorosamente a todas as divindades conhecidas e desconhecidas por ser apenas um o dia dos namorados, porque, caso contrário, poderia se chamar o dia dos endividados.

Bem, um feliz dia dos endivida... quer dizer, namorados para todos.


Alberto da Cruz

6 de junho de 2011

Sal, cal e alho

Foi apenas uma brincadeira, um trote para formatura, mas a homenagem foi belíssima. A nerdice contagiou o 3º ano do COSAF e arrancou gargalhadas em todas as salas. Hoje não me senti sozinho, hoje um bando de nerds esteve comigo, iguais temporários, semelhantes por instantes...


Aproveito o momento e parabenizo a turma pelas excelentes notas na avaliação de Literatura. Depois de Gregório, o Barroco ficou fácil... "Sal, cal e alho"

Alberto da Cruz

4 de junho de 2011

Reencontro

Depois de passar por maus bocados na Feira LIterária Raul Pompeia, tive o prazer de reencontrar Evanildo Bechara. Fazia 7 anos desde que nos encontramos pela última vez, num curso de Letras qualquer.
Hoje, a promessa, segundo o próprio benemérito, continua uma promessa, apesar de mais velha e madura do que antes.

Alberto da Cruz

17 de maio de 2011

Intermitência: a separação dói

O casamento é mesmo uma instituição falida?

É possível sobreviver a uma separação sem guardar mágoas e ressentimentos? Quem pode entender o que se passa na mente dos homens e das mulheres quando estão absorvidos pela ira, no calor da última discussão?

Em intermitência, o autor nos convida a assistir, como espectadores diretos, à ultima noite de Almira e Roberto como casados. Uma noite em que são expostos os problemas que minaram a relação amorosa dos dois, antes apaixonados, agora inimigos.

Pior que o fim da relação são os segredos revelados, os diversos erros cometidos no passado e o estrago que causam no presente.

A porta está aberta.

"Esta vida é mesmo uma droga. O que eu faço? Se fosse fácil dizer o que me sufoca, já teria dito, mas não é nada fácil mexer nesta ferida mal-cicatrizada. O que eu ganho? O que ele ganha? Todos nós perdemos!"

Impresso
R$ 33,46

Autor: Alberto da Cruz
Tema:
Literatura Nacional
Palavras-chave: amor, separação, sexo
Número de páginas: 138
Peso: 228 gramas
Edição: 2(2010)
ISBN: 978-85-7794-109-4
Formato: Médio (140x210mm), brochura com orelhas.

Pesadelos: contos de horror e medo

Em PESADELOS, Alberto da Cruz nos apresenta cinco histórias distintas de horror e medo, um convite para os lados obscuros da mente, onde não há limites para o imaginável e estranho mundo do sobrenatural.

Brincadeira Macabra - Rejeitas por todos na escola, um grupo de amigas evoca espíritos num ritual macabro para se vingarem dos seus inimigos, mas algo dá errado. O que as levaria à satisfação se torna o princípio do fim, num pesadelo aterrorizante, cruel e violento.

O Cálice - Pai carinhoso e marido dedicado, Érico de Sousa se transforma em um homem violento, atormentado por vozes em sua cabeça. Antes de encontrar um antigo cálice preso às redes da Companhia de Pesca Farto Mar, ele jamais imaginaria que sua vida pacata estaria condenada para sempre.

O Homem dos Olhos de Fogo - Depois da morte do filho, um diário é o único meio para uma mulher assombrada por fantasmas perigosos desabafar seus temores, seus medos e sua vida despedaçada pela dor.

O Refém - Um assalto a um posto de gasolina, une dois homens, assaltante e vítima, aos seus piores pesadelos. Num conflito intenso, a realidade é tomada por alucinações perversas e criaturas medonhas.

Inspiração - Julian Machado, um talentoso escritor, pena para terminar seu novo livro. O tempo é curto e a inspiração inexiste. Coagido pelo seu editor, Julian se vê obrigado a levar a ficção para a realidade, mudando para sempre o seu destino.

Impresso
R$ 32,11

Autor: Alberto da Cruz
Tema:
Ficção, Literatura Nacional

Palavras-chave:
contos, suspense, terror
Número de páginas: 128
Peso: 218 gramas
Edição: 1(2010)
Formato: Médio (140x210mm), brochura com orelhas.